Líbero Badaró

Precursor da liberdade de imprensa

A breve e heroica vivência do italiano Giovanni Battista Líbero Badaró (1798-1830) acabou se transformando num marco na defesa da liberdade de expressão no país cujo desfecho trágico, em 1830, no ocaso do Primeiro Reinado, mostrou o grau de tensão em que o Brasil estava mergulhado naquele período.

Médico recém-formado, Badaró tinha 28 anos quando chegou ao Brasil em 1826, junto com outros médicos italianos, para tentar a vida longe da Europa. Era alto e magro, usava longas costeletas e óculos de lentes redondas. Dois anos depois, em 1828, decidiu se estabelecer na cidade de São Paulo, onde clinicava e dava aulas gratuitas de matemática.

Adepto do liberalismo, em voga na época, fundou em 1829 o jornal O Observador Constitucional, no qual denunciava os abusos da monarquia sob D. Pedro I – como escreveu Badaró no editorial do primeiro dia de circulação do jornal: “Não devia vegetar no Brasil a planta do despotismo”.

Em pouco tempo, Badaró começou a ficar conhecido na capital paulista, então com apenas 20 mil habitantes, como um defensor da liberdade de expressão. Em 1830, Badaró acompanhou e elogiou o movimento que, na França, derrubou o rei Carlos X. Acreditava que os brasileiros deveriam fazer o mesmo com D. Pedro. 

Inspirado no que ocorreu na França, foi convocada uma passeata em São Paulo, com apoio do Observador Constitucional, que reuniu comerciantes, artesãos e estudantes, exigindo liberdade e participação política popular. 

O ato foi reprimido por ordem do chefe do Poder Judiciário de São Paulo, o desembargador-ouvidor Candido Ladislau Japiaçu, um conhecido desafeto de Badaró – que havia ridicularizado Japiaçu por censurar peças de teatro e perseguir estudantes. O Observador Constitucional abriu campanha em favor dos acusados e atacou Japiaçu, chamando-o “Caligulazinho”.

Na noite do dia 20 de novembro de 1830, quando voltava para casa, Badaró foi abordado na Rua São José (atual Rua Líbero Badaró) por quatro alemães, que diziam querer lhe entregar uma denúncia contra o ouvidor Japiaçu. Era uma cilada: um deles fuzilou o jornalista com um bacamarte.

Socorrido, foi levado a um hospital. No dia seguinte, antes de morrer, Badaró – de apenas 32 anos – pronunciou uma frase quer ficou marcada: “Morre um liberal, mas não morre a liberdade”. O crime causou uma comoção. Cerca de cinco mil pessoas conduziram o caixão com seu corpo até o Cemitério da Consolação.

O principal responsável pelo ataque fora Henrique Stock, alemão que se escondeu na casa de Japiaçu. O povo exigia a prisão de ambos. O alemão Stock foi preso em seguida, mas o desembargador-ouvidor seguiu em liberdade até que o Conselho de Governo da Província decidisse enviá-lo para o Rio de Janeiro, sob escolta. Stock acabou condenado pelo assassinato, mas Japiaçu, o “Caligulazinho”, foi inocentado. De acordo com muitos historiadores, a ordem para matar Badaró pode ter partido do próprio D. Pedro 1º.

Meses depois, entre março e abril de 1831, uma série de protestos colocava pressão sobre o imperador, incluindo a Noite das Garrafadas — com violentos conflitos entre portugueses e brasileiros nas ruas do Rio de Janeiro, com participação de negros livres e escravizados –, e distúrbios por medidas arbitrárias adotadas pelo imperador, como a dissolução do gabinete de ministros brasileiros e a nomeação, em seu lugar, de aristocratas fiéis à monarquia. 

Na madrugada de 7 de abril, D. Pedro I entrega sua carta de abdicação, legando o trono a seu filho de 5 anos de idade, futuro Pedro II. A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) foi fundada justamente em 7 de abril, em 1908.

Em 1931, por ocasião dos 100 anos do levante que derrubou D. Pedro I, a entidade decidiu estabelecer a data como o Dia do Jornalista. Líbero Badaró foi considerado um dos primeiros jornalistas a defender a liberdade de imprensa no país, refutando sempre a tese de que os abusos praticados pela imprensa justificariam o cerceamento da liberdade.

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