Chico Mendes

O líder seringueiro que virou símbolo de preservação da Amazônia

A história do seringueiro e líder sindical Francisco Alves Mendes Filho (1944-1988), o Chico Mendes, ficou marcada pela coragem com que denunciou o desmatamento, a atividade predatória de grileiros e fazendeiros e a opressão sofrida pelas comunidades extrativistas da Amazônia.

Sua atuação política foi decisiva para levantar a discussão sobre a necessidade de se buscar um modelo socioeconômico sustentável na Floresta Amazônica, entre eles a criação de reservas extrativistas, áreas preservadas e florestas públicas — o que só passaria a ser adotado após a sua morte, em meio a uma grande mobilização de ambientalistas, lideranças políticas e da comunidade internacional.

Filho de um seringueiro, Chico Mendes nasceu em Xapuri (AC) e passou a infância e adolescência ajudando o pai. Como a maioria das famílias que viviam da extração de borracha, os Mendes não tinham posse da terra e passaram a viver sob ameaça a partir da década de 1970, quando o regime militar implementou uma política de incentivo de ocupação da Amazônia que acabaria fomentando conflitos de terra.

O objetivo era distribuir terras para agricultores que vinham de outras partes do país, estimulando a substituição de práticas extrativistas das comunidades que sempre viveram na região pela pecuária. O primeiro efeito foi o aumento do desmatamento e da devastação ambiental, para abrir pastos para a criação de gado.

Chico Mendes, que aprendeu a ler apenas aos 16 anos, decidiu partir para a militância política e com 31 anos já atuava como secretário-geral do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Brasiléia, cuja pauta era a defesa da atividade extrativista. Uma das armas usadas para impedir a derrubada de seringais para abertura de pastos era a tática do “empate” — manifestações pacíficas em que os seringueiros protegiam as árvores com seus próprios corpos.

No ano seguinte, em 1977, Chico participou da fundação do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri e acabou eleito vereador pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB), único partido de oposição tolerado pelo regime militar.  Sua entrada na vida político-partidária irritou grileiros de terra e fazendeiros, que passaram a ameaçá-lo.

Acusado de subversão, chegou a ser preso e torturado, mas a conivência das autoridades locais com os fazendeiros impediu que sua tortura fosse registrada pela polícia. Depois de ajudar a fundar o Partido dos Trabalhadores no Acre, em 1980, Chico começou a chamar a atenção da grande imprensa como um líder seringueiro, principalmente após ter participado de comícios ao lado de Luis Inácio Lula da Silva na região.

Nesse mesmo ano, o presidente do Sindicato dos Trabalhadores de Brasiléia, Wilson Sousa Pinheiro, foi assassinado por jagunços a mando de fazendeiros, expondo o grau de violência e tensão na região. Chico Mendes acabou sendo enquadrado na Lei de Segurança Nacional como “subversivo” a pedido de fazendeiros – que o acusaram de ter incitado o assassinato de um capataz de fazenda envolvido na morte de Pinheiro (Chico acabaria sendo inocentado anos depois, por falta de provas).

Em 1981, Chico Mendes assumiu a direção do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri, do qual foi presidente até sua morte. Nos anos seguintes, intensificou a luta dos seringueiros pela preservação do seu modo de vida. Em 1985, liderou a criação do Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS), que se tornou a principal referência da categoria. Do encontro saiu a proposta de criar uma “União dos Povos da Floresta”, que buscava unir os interesses de indígenas, seringueiros, castanheiros, pequenos pescadores, quebradeiras de coco e populações ribeirinhas, através da criação de reservas extrativistas. 

No ano seguinte, Chico Mendes atraiu a ira dos fazendeiros e grileiros de terra da região amazônica após receber a visita de membros da Organização das Nações Unidas (ONU) em Xapuri. Com forte cobertura da imprensa internacional, denunciou à delegação da ONU que projetos financiados por bancos estrangeiros estavam levando à devastação da floresta e à expulsão dos seringueiros. Dois meses depois, suas denúncias ganharam ainda mais repercussão ao levá-las ao Senado dos Estados Unidos e à reunião de um dos bancos financiadores do projeto, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

Os financiamentos aos projetos na Amazônia acabaram suspensos e Chico Mendes passou a acumular ameaças de morte. Sua luta ganhou ainda visibilidade meses depois, quando recebeu vários prêmios internacionais, dentre eles o Global 500, oferecido pela ONU por sua luta em defesa do meio ambiente.

Ao longo do ano de 1988, o ativista viajou pelo país para denunciar as condições difíceis dos seringueiros e as ameaças de morte que não paravam de crescer. 

Em 22 de dezembro de 1988, uma semana após completar 44 anos, Chico Mendes foi assassinado com tiros de escopeta na porta de trás de sua casa, em Xapuri, disparados por Darci Alves, o qual cumpria ordens de seu pai, Darly Alves, grileiro de terras da região. O crime causou comoção internacional, por parte de ONGs e governos, que exerceram forte pressão sobre o governo brasileiro para a punição dos assassinos (o que ocorreria apenas em meados da década seguinte).

Dois anos depois de sua morte, o maior sonho de Chico Mendes, pelo qual tanto lutou, se concretizou. Em 1990, foram criadas as primeiras reservas extrativistas, sendo uma das primeiras a Reserva Extrativista Chico Mendes, com 970 mil hectares. As reservas florestais foram usadas para a colheita não-predatória de matérias-primas como o látex e a castanha do pará.

Em 2004, Chico Mendes teve seu nome incluso no Livro dos Heróis da Pátria. Já em 2013, 25 anos após a sua morte, ele foi declarado Patrono Nacional do Meio Ambiente. Boa parte das políticas sustentáveis adotadas nas últimas décadas na Amazônia –incluindo a criação de reservas extrativistas, concessão de florestas nacionais para extração de madeira com selo de certificação e o modelo socioeconômico sustentável de exploração da floresta para as comunidades ribeirinhas – foram defendidas por Chico Mendes.
Em sua homenagem, o governo federal criou, em 2007, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão vinculado ao Ministério do Meio Ambiente  responsável pela administração das Unidades de Conservação (UCs) federais, realizando a fiscalização e monitoramento dessas unidades. O instituto também executa programas voltados para pesquisa, proteção e preservação da biodiversidade.

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